Rastro das Mudanças E2

Seleção de artigos

1. Why Japanese Businesses Are So Good at Surviving Crises - Harvard Business School Working Knowledge - Os japoneses são pioneiros em uma visão mais integrada sobre o papel das empresas na sociedade e certamente uma fonte de inspiração em um momento em que propósito é uma pauta tão discutida nos círculos de marketing.2. Hey developers, Brazil is waiting for you - VentureBeat  - Uma visão mais otimista sobre o futuro do Brasil para o que tem a ver com pautas digitais e os mais jovens, possivelmente relacionada com a ideia de recuperação em K da economia global.3. The Future of Banking: Tomorrow Will Be Radically Different - The Financial Brand  - Com a “financialização” de grandes varejistas e marketplaces assim como de serviços como os superapps e o fluxo mais livre de dados financeiros dos consumidores trazidos pelo open banking, a própria ideia do que é um serviço financeiro passa por uma rápida desconstrução - este artigo explora alguns caminhos possíveis para o futuro. 

Serviço contemporâneo: Revolut

Nesta discussão sobre o futuro dos serviços financeiros, um caso muito frequentemente mencionado é o do Revolut.

Fundado em Londres em 2015, o Revolut é uma fintech que combina um cartão de débito pré-pago e uma carteira multimoedas (30 no total), permitindo que os usuários transacionem entre todas elas sem taxas e pelo câmbio interbancário (desde que abaixo dos valores mínimos e as operações sejam feitas durante a semana). Além das 30 moedas internacionais, o Revolut também permite compra e venda de criptomoedas como Ethereum e Bitcoin.

O Revolut também ajuda seus usuários na gestão de seus gastos entre todas as moedas com autocategorização e essa gestão pode ser estendida a outras contas e cartões através do open banking nos países onde já houve a implementação, com a vantagem de agregar transações em diversas moedas distintas.

A versão mais simples do serviço é gratuita. As versões pagas acrescentam limites maiores para transferências e saques sem taxas, seguro viagem e seguro saúde internacionais e cashback sobre as transações, acesso a salas VIP em aeroportos e um concierge, no nível mais alto.

Como foi mencionado na edição passada, essa ideia de um serviço contemporâneo se refere ao quanto conectado ele está com ideias e valores que são os de hoje ou emergentes, de preferência em um ponto de encontro entre eles. Estes são alguns pontos que o Revolut liga:

Multidisciplinaridade e desintermediação do conhecimento como caminho para centralidade no cliente

A pauta da centralidade no cliente em discussão crescente nas empresas incumbentes é vista como a primeira linha de defesa contra os “bárbaros nos portões”, menores e mais ágeis, quanto como uma arma capaz de varar as muralhas de caixas vastos e orçamentos de comunicação gigantescos das empresas maiores pelos insurgentes.O problema da ideia de centralidade no cliente é que ela ainda dá muita margem para interpretações distintas e muitos tem dificuldades de convertê-la em desdobramentos mais práticos, e por isso ela infelizmente pode acabar mais presente no discurso e na intenção do que na prática. E para que essa ideia tão importante não vire um projeto ou iniciativa isolada que gera muita auto-congratulação entre os executivos envolvidos mas pouco impacto para o cliente que mantém a luz acesa, precisamos de uma definição de sucesso e de métricas. Centralidade no cliente é um pouco como ser artista: você precisa que alguém diga que você é, não basta você mesmo dizer - e essa admiração verdadeira dos acontece a pouquíssimas marcas e não pode ser medida (só) por participação de mercado, por um funil de comunicação ou por NPS. Um caminho possível, mas com obstáculos, é trazer quem representa a voz dos clientes para a mesa para que os interesses deles sejam representados em todas as grandes decisões a serem tomadas pela empresa, de forma não subordinada a outros departamentos que possam ter interesses conflitantes, principalmente comercial, marketing e produto. Este texto é uma reflexão sobre caminhos para chegarmos até lá. O primeiro obstáculo é a capacitação. Se anos atrás algumas empresas de pesquisa separavam profissionais qualitativos de quantitativos, compartimentalizando conhecimento e criando obstáculos para mais visão de todo, hoje em dia ser “monoespecialidade” parece ainda mais ineficiente, com as disciplinas que envolvem entendimento das pessoas e de dados aumentando de número e em complexidade, de analytics a ciência de dados passando por social listening, UX e economia comportamental. Uma das piores coisas que pode acontecer a um profissional da área é ficar confortável demais em apenas uma delas - a chance de potencializar pontos cegos é simplesmente grande demais para ser desconsiderada. A história de "lifelong learning” e do “profissional em T” realmente se aplica muito a quem tem  a responsabilidade de interpretar pessoas e dados. Essa fluência interdisciplinar vai ser cada vez mais importante e saber comprar pode não ser o suficiente - o senso crítico de quem sabe fazer é muito mais afiado.Nossa relação com a capacitação depende muito de como avaliamos a complexidade do assunto. Muita complexidade aparente pode nos intimidar e nos afastar do conhecimento. Um pouco do hype e até de alguma sobrevalorização da ciência de dados e analytics talvez ocorra porque a curva de aprendizado é íngreme e quem escala a montanha muitas vezes cede à tentação de ocultar as limitações das análises ou mesmo do escopo do trabalho (por exemplo em topic modelling e sentiment analysis, que são vendidas como autônomas mas na verdade ainda precisam de muita análise humana para entregar resultados usáveis). Existe claramente um interesse velado em manter a aura “mágica” e hermética do assunto.Em contrapartida, subestimar a complexidade real de campos de conhecimento que parecem ser mais acessíveis nivela por baixo as expectativas, as entregas, e consequentemente o mercado.O segundo obstáculo é a automação de pelo menos parte do trabalho operacional. Não adianta ter toda a capacidade analítica e sensibilidade cultural do mundo se o dia a dia é dominado por curar e reportar informações para as áreas clientes ao invés de trabalhar em novos projetos e em melhorias para os existentes. Um passo fundamental para essa “libertação” é a criação de um repositório de todo este conhecimento (em seus distintos formatos!) que possa ser acessado por todos que tenham interesse em suas informações de uma forma “auto serviço” que permita uma visão sucinta e de múltiplas fontes sobre quem é o cliente e suas interações com a empresa. Aqui, o desafio é ser dono do conteúdo e dos processos sem ser gargalo.Não somos os primeiros a propor que a função cada dia mais essencial de monitorar o contexto cultural seja cargo executivo (veja a recomendação de livro desta newsletter) e a ideia da voz do cliente ter um lugar na mesa do board vem ganhando massa crítica em alguns círculos importantes. Esse texto não é só um argumento a favor dessas duas coisas, mas é para ser um empurrão na direção do aprendizado constante (não só empírico mas formal também!) e da combinação de disciplinas e perspectivas distintas. Essa cadeira proposta aqui ainda não existe, e para que ela exista, é preciso que haja profissionais em condições de exercê-la. Acredito que os profissionais que hoje cuidam da voz do cliente hoje são os candidatos mais fortes a essa posição (e não os técnicos das disciplinas mais modernas, com perfis menos humanistas no geral), mas essa ascenção dificilmente acontecerá sem muito investimento (pessoal inclusive!) em novas habilidades e a ousadia de desintermediar o acesso ao conhecimento produzido.

Livro: Chief Culture Officer - Grant McCracken

O Chief Culture Officer foi escrito em 2009 por um dos maiores antropólogos do consumo vivos, o canadense Grant McCracken, ainda na infância das mídias sociais. Seu conteúdo, visionário no lançamento, é hoje mais contemporâneo do que nunca.A premissa que entitula o livro é a ideia de haja alguém no corpo executivo das empresas dedicado a observar transformações culturais (alguma delas difíceis de serem quantificadas) que impactem o consumo e eliminar pontos cegos que podem prejudicar a comunicação (como aconteceu na campanha de carnaval da Skol de 2015 ou mais recentemente, na da esponja Krespinha), o posicionamento e a estratégia das marcas, assim como identificar oportunidades que passariam despercebidas olhando só para os números e dados estruturados.Nesta ênfase na importância da cultura para o consumo e na invisibilidade dessas transformações para muitas empresas, o livro converge um pouco com o Small Data do dinamarquês Martin Lindstrom que prega que quantidade nenhuma de dados estruturados ou nenhum nível de complexidade tecnológica são capazes de capturar certas sutilezas humanas que são críticas para o sucesso de marcas e produtos. A diferença fundamental entre os discursos é que para Grant, o rigor e e a qualidade do processo são o caminho para melhores resultados: “Standards, knowledge, continual learning, the ability to process massive bodies of data and possibility, the ability to spot the crucial development in a perfect storm of possibilities—this, and not intuition, is the work of the CCO.”O olhar centrado na cultura defendido por McCracken complementa perfeitamente os dados comportamentais, cada vez mais presentes conforme mais das transações acontecem em ambientes digitais e a combinação dessas duas frentes parece ser o caminho para a tão discutida centralidade no cliente. Nas palavras dele: “Finally, the ethnographic interview needs access to the data and intelligence that matter to big management consulting houses like Monitor and McKinsey. Now ethnography is looking at the life of the consumer from the outside in. When we put these two together, real insight becomes possible.”Capaz de dizer muito com poucas palavras, o livro é uma leitura leve e fundamental para quem trabalha com entender escolhas de consumo em qualquer nível.

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